domingo, 11 de março de 2012

Com a palavra... Celso Correia Lopes


Com a estreia da Turma 46 chegando (dia 17 de março, às 20h), entrevistamos o Diretor Celso Correia Lopes sobre o processo de "Trabalhos de Amor Perdidos". Você confere a entrevista na íntegra: 

Como está a ansiedade antes da estreia?
Quando se monta Shakespeare pela primeira vez, a ansiedade já começa desde que se escolhe fazê-lo. Embora seja uma comédia (e no fundo a gente sempre acha que seja mais fácil) o processo exigiu muito de todos. Foi uma imersão no universo Shakesperiano, uma imersão na texto e principalmente uma imersão nas ações, uma vez que a estrutura textual e sua forma de escrita nos levam para um "engessamento" da cena. Nosso maior trabalho foi, e está sendo, fazer as ações fluirem no palco.

Como foi a escolha do texto? Por que montar Shakespeare?
Existem muitas discussões a esse respeito. Por que montar Shakespeare num momento em que a obra teatral é infinita? Da minha parte, fiz nesses últimos anos muitos processos colaborativos cujas questões permeavam na busca do que é ser, ou seja, o ser humano em seu extrato, independente das suas escolhas filosóficas e éticas. A mais potente nessa minha levada foi o espetáculo "O que não disseram", depois de muito experimentar a gente vai se desgastando e começa a arejar a cabeça com outros meios de realização. Daí fui para a comédia, fiz um outro espetáculo inspirado na Opereta "A ópera dos mendigos", de John Gay e em seguida fui persuadindo o elenco a fazer Shakespeare e a fazer comédia. Essa "persuasão", para mim, era justamente o ponto de intersecção entre diretor e grupo. O grupo havia passado, em seus ultimos processos, por textos muito coloquiais e alguns de cunho social. A ideia é sempre gerar repertório, e assim o texto clássico viria justamente para equilibrar as experiências do grupo. Já havia da minha parte uma curiosidade sobre Shakespeare e então agucei o grupo para a investigação do texto clássico. Nisto tudo somou a pesquisa do texto e suas potencialidades na encenação. "Trabalhos de amor perdidos" vinha de encontro com o grupo, como o momento de vida do grupo. São jovens que precisam fazer escolhas a todo momento e essas escolhas refletem em felicidades ou arrependimentos. "Trabalhos" também fala disso e então a gente juntou tudo no caldeirão e fomos em busca de um espetáculo.

Esta peça, "Trabalhos de Amor Perdidos", se mostra atual? Qual a trama central?
O texto tem essencialidades humanas, e partindo por este viés ele é atual. É óbvio que o conteúdo "Shakespeareano" não é atual, ele tem enredo e escrita que podemos chamar até de ultrapassados. Mas como ele constrói o enrendo é genial. Inclusive Eduardo Berton (o diretor musical) e eu estávamos discutindo isso -  a consciência do autor na divisão dos atos, na circulação de personagens e de como uma trama simples é interessante. Se temos um texto bom, numa forma antiga, fica então a encenação responsável a dar o olhar contemporâneo. O enredo é de Shakespeare, né? Então amor à primeira vista, troca de cartas e disfarces estão na comédia. Também tem a nobreza e os bufões, mas na coméida o mais legal é que o nobre também se junta ao camponês em matéria de amor. O Rei de Navarra e seus conselheiros (Berowne e Longaville) assinam um tratado polêmico a fim de tornar Navarra uma pequena universidade. O lema é estudar. As alegrias típicas dos jovens, bem como suas descobertas estão proibidas. Porém, chega a Navarra a fim de definir um empasse entre Reinos a princesa de França, acompanhadas por suas damas Rosaline e Katherine. Daí em diante já dá para imaginar o que vai acontecer.

Celso e Lígia Campos, que orientou os alunos para a Comédia, em um dos ensaios da Turma.

Quais foram as dificuldades do grupo em usar um texto que não faz parte das obras clássicas deste autor? E por que uma comédia?
Já disse que o texto é simples e que o autor tem genialidade em conduzi-lo, então o trabalho do processo está justamente na descoberta das entrelinhas, nuances, tempos e ações. A dificuldade está em traduzi-lo para uma coloquialidade de fala e ação. Quando se fala em Shakespeare todo mundo enche o peito para fazer. Também não temos uma visão sobre nobreza (tudo bem que o Brasil foi corte e tudo mais), mas não está no nosso sangue essa relação de Rei e Rainha. Então entender as ações e relações desses nobres foi um processo longuíssimo de repetição. Os bufões também nos deram muito trabalho, a compreensão da comédia e suas convenções foram exaustivamente experimentados. Todo mundo acha que drama é difícil. Isso é coisa do Aristóteles. Comédia é uma arte difícil, porque é uma arte da precisão, do carisma, da percepção e do reconhecimento do público. Essa investigação a gente carrega pro resto da vida.

Diga algumas palavras sobre William Shakespeare.
Shakespeare é ótimo. Mas sempre temos maravilhosas montagens dos mesmos textos. Acredito que temos que difundir mais o repertório do autor. Que precisamos levar essas obras consideradas problemáticas e montá-las, dar vida, achar soluções para elas.
















 "Trabalhos de Amor Perdidos" estreia dia 17 de março, com temporada até 20 de maio. 
Sábados, às 20h. Domingos, às 19h. 
Ingressos: R$10,00 inteira; R$5,00 meia. 
Na Fundação das Artes. 

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